Por Eurico Filho 17/12/2024
Mais uma tragédia que poderia ter sido evitada
Ontem, 16/12/24, ao descer para a Baixada Santista, mais precisamente para minha cidade natal, Cubatão, me deparei com a notícia de um incêndio na Vila dos Pescadores. O fogo teve início por volta das 8h30 e consumiu várias moradias. Graças a Deus, não houve vítimas fatais nem feridos graves. Foi nesse momento que refleti, mais uma vez, sobre o porquê desses eventos se repetirem pelo Brasil afora. Em Cubatão, minha cidade, isso já virou rotina. Eu mesmo já presenciei, há alguns anos, um incêndio próximo de minha casa, na Vila Esperança, antes de me mudar para Campinas.
Os incêndios em palafitas são um problema recorrente em várias cidades brasileiras, onde moradias precárias são comuns. Em 24 de fevereiro de 1984, quando eu tinha 16 anos, passei de ônibus em frente a um cenário desolador. Um incêndio havia destruído as palafitas da Vila São José, mais conhecida como Vila Socó. O local tinha esse nome devido à presença de aves cinzas chamadas socós, parentes das garças e guarás vermelhos. A tragédia ocorreu devido a um vazamento de óleo diesel na tubulação da Petrobrás, que passava por detrás da vila, próxima à Rodovia Anchieta. Os moradores começaram a armazenar o óleo em suas moradias de madeira, construídas sobre palafitas. Naquela noite, com a maré alta e as casas tomadas pelo óleo, alguém acendeu um cigarro e jogou a bituca na água contaminada. Isso deu início ao incêndio, que pegou muitas pessoas dormindo, resultando em um horror inimaginável: inúmeros feridos, mortos e desabrigados.
Esses incêndios são frequentemente causados por condições precárias de vida, como instalações elétricas inadequadas, fogareiros ou velas mal apagadas, somando-se à abundância de materiais combustíveis. Esses fatores facilitam a rápida propagação das chamas. No entanto, a verdadeira raiz do problema está na falta de políticas públicas eficazes para combater a pobreza e a desigualdade socioespacial.
Algumas das dimensões que contribuem para esse problema incluem:
- Desigualdade socioespacial: A cidade de Cubatão apresenta grande disparidade entre ricos e pobres, com vastas áreas ocupadas por comunidades de baixa renda que vivem em favelas.
- Vulnerabilidade: Palafitas são frequentemente construídas em áreas de risco, como margens de rios e mangues. Essas regiões sofrem com infraestrutura precária, esgoto a céu aberto e construções de madeira ou alvenaria muito próximas, o que facilita a rápida propagação de incêndios.
- Visão estereotipada: Palafitas são vistas como símbolos de pobreza e miséria, em vez de serem reconhecidas como uma forma legítima de moradia. Por serem consideradas ilegais, há um descompromisso das autoridades em garantir melhorias estruturais e segurança a essas habitações.
- Ineficiência das políticas públicas: Poderiam ser criados programas para atender a população dessas áreas, mas parece que manter as pessoas na miséria ainda é a melhor maneira de prendê-las ao voto. Promessas são feitas a cada eleição, mas a realidade permanece a mesma: famílias continuam vivendo em condições desumanas.
É necessário que as autoridades adotem uma abordagem mais eficaz para enfrentar esses problemas, com políticas públicas que promovam a igualdade socioespacial e garantam habitação digna para todos.
Acorda, Brasil!