Duração prolongada, sigilo questionado e implicações jurídicas preocupam especialistas e advogados
Por Redação Atitude New 17/12/2024
O Supremo Tribunal Federal (STF) prorrogou novamente o prazo do inquérito das fake news por mais 180 dias. A decisão, assinada pelo ministro Alexandre de Moraes, amplia as investigações sobre o chamado “gabinete do ódio”, supostamente ligado ao governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Desde março de 2019, quando foi instaurado, o inquérito se encontra sob sigilo e acumula questionamentos sobre sua condução e extensão temporal.
Prorrogação excessiva: uma exceção ou um risco jurídico?
Embora o Código de Processo Penal (CPP) preveja que um inquérito policial deve ser concluído em até 30 dias para investigados em liberdade (artigo 10), a realidade do inquérito das fake news tem sido diferente. A duração já ultrapassa cinco anos, gerando críticas de juristas e advogados sobre sua legalidade e proporcionalidade.
A prorrogação constante é justificada pelo STF como necessária devido à complexidade das investigações, que envolvem quebras de sigilos fiscal e bancário e a análise de dados extensos. No entanto, especialistas em direito penal apontam que o prolongamento indefinido de um inquérito pode se tornar uma violação ao devido processo legal e à razoável duração do processo, garantidos pela Constituição Federal no artigo 5º, inciso LXXVIII.
Sigilo e a dificuldade na ampla defesa
Outro ponto controverso é o sigilo que envolve as investigações. Advogados de defesa criticam a dificuldade de acesso aos autos, alegando que o segredo processual prejudica o exercício da ampla defesa e do contraditório, princípios fundamentais garantidos pela Carta Magna no artigo 5º, inciso LV.
A Associação Brasileira de Advogados Criminalistas (Abracrim) e outras entidades têm questionado a transparência e legalidade da condução do inquérito, especialmente quando ele se expande para investigar cidadãos que não possuem prerrogativa de foro privilegiado, mas que são conduzidos pela Suprema Corte, instância responsável exclusivamente por julgar altas autoridades, como deputados, senadores e ministros.
Ramificações do inquérito e seus desdobramentos
Originalmente instaurado para investigar a disseminação de notícias falsas, o inquérito das fake news tem se expandido para abranger outros fatos e atores. As ramificações atingem políticos, jornalistas, empresários e influenciadores digitais. Essa amplitude gera debate sobre os limites da competência do STF e a necessidade de se respeitar as instâncias inferiores.
O professor de Direito Constitucional, Marcelo Navarro, alerta para o precedente criado:
“Quando o STF assume casos que envolvem pessoas sem foro privilegiado, há uma subversão no princípio do juiz natural. A corte suprema é instância recursal e não pode se tornar um órgão de investigação permanente.”
Além disso, críticos apontam que o inquérito tem se tornado um instrumento quase atemporal, contrariando a previsão legal de que investigações devem ser concluídas em prazo razoável. Sem um fim definido, há o risco de prejudicar direitos individuais e criar um cenário de insegurança jurídica.
Impacto político e a necessidade de equilíbrio
O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, justificou a nova prorrogação afirmando que eventos recentes exigem a continuidade das apurações. Contudo, o prolongamento de investigações em um cenário polarizado alimenta percepções de seletividade e de interferência institucional no debate público, tema sensível para a democracia brasileira.
A prorrogação de inquéritos dessa magnitude levanta um alerta para a sociedade e para os poderes constituídos:
- Por quanto tempo uma investigação pode se prolongar sem ferir garantias constitucionais?
- Até que ponto o sigilo pode ser mantido sem prejudicar a transparência e os direitos dos investigados?
Conclusão
O inquérito das fake news permanece como um dos casos mais polêmicos conduzidos pelo STF. Embora as justificativas da corte estejam ancoradas na complexidade do tema e na necessidade de apuração, os questionamentos jurídicos e as implicações políticas não podem ser ignorados. A continuidade das investigações exige um equilíbrio delicado entre a busca pela verdade e a preservação dos direitos constitucionais, evitando que o processo se torne um risco para a segurança jurídica e a confiança nas instituições.